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14 de dezembro de 2009

Pergunte ao seu taxista

Em 04.11.2009, alguns “especialistas” de futebol lançaram suas predições sobre o resultado final do Campeonato Brasileiro de 2009 por meio de um simulador de classificação, no qual foi divulgado em um site de grande prestígio. Eis as suas profecias: três times apareceram como prováveis campeões: o São Paulo, Palmeiras e Atlético-MG, este apontado como o provável vencedor do Brasileirão (!).

Bom, creio que todos devem saber, inclusive aqueles que não acompanham jogos pela TV, que o Flamengo levou o penta hexacampeonato para a casa. E para os mais desavisados, o clube São Paulo ficou na quarta posição do campeonato (droga), e o provável campeão, Atlético-MG, segundo os especialistas, empacou o sexto lugar (nem libertadores vão pegar ano que vem). O que eu quero dizer com isso? Bom é bastante óbvio até, a nossa incapacidade de realizar diagnósticos, em determinadas áreas, ou prever determinada ocorrência, é ridícula. Vamos analisar (superficialmente) o problema do especialista.

Responda rápido: numa futura cirurgia cerebral, você preferiria ter ela realizada por um jornalista da área de ciências, ou por um neurocirurgião diplomado? Por outro lado, você preferiria ouvir uma previsão econômica de um jornalista da área de economia, ou por alguém com pós doutorado em finanças? Enquanto a primeira pergunta está muito clara a resposta que seria o neurocirurgião, na segunda ela não é tão óbvia assim. Veja que muitas pessoas escolheriam uma opção, e muitas outras escolheriam a outra opção, não há um consenso. E por quê?

Entre outros fatores, essa diferença acontece pelo movimento que ocorre em cada área. As de pouco movimento, ou seja, áreas que requerem mais técnica, ou “saber como”, parece haver efetivamente especialistas. Em situações de muito movimento, em que o importante é “saber o quê”, ou o conhecimento precisa estar sempre renovável, ou são profissões que baseiam suas funções na previsão de futuros por meio de dados do passado não-repetitível, tendem a não possuir especialistas no sentido literal da palavra. (no final do post coloquei alguns exemplos de profissões para as duas áreas)

Sendo assim, qual a função de especialistas para áreas de movimento elevado? Eu não quero entrar no mérito, ou muito menos desrespeitar tais profissionais, porém existem estudos que indicam que o conhecimento adquirido a mais (para ser formar especialistas) por tais profissionais, não exerce um efeito mais relevante comparado a uma pessoa recém graduada, por exemplo. Em alguns casos, como eu acredito ser no exemplo dos “especialistas em futebol”, o problema é mais agravante. Uma brincadeira é você ouvi-los e comparar seus diagnósticos com a opinião do seu taxista (com todo respeito a classe), veja que o “rigor” a que se conclui uma previsão será praticamente o mesmo. E se fosse para apostar, ficaria com o taxista, ele, humildemente, palpitaria o que achava, não teria excesso de conhecimento (ou o problema do excesso de informação como disse num post anterior), suas chances seriam relativamente maiores, sem ser especialista de nada.

E o que me deixa mais indignado, é a cara de pau desses especialistas que prevêem a todo o momento; jornalistas publicam em importantes sites, revistas, jornais e TV; muitas pessoas pagam para ouvi-los, e quando temos efetivamente o resultado (muito distante das suas previsões), eles não aparecem com um pedido de desculpa, ou não nos dizem o porquê de tal discrepância, ou se dizem, colocam culpas no simulador, ou em alguma influência não possível de ser manipulada. Nunca é culpa deles, eles não se dão conta da própria natureza do trabalho: nós simplesmente não podemos prever. Mas é difícil acreditar nisso, nós sempre buscaremos explicações para tudo, os “especialistas” sempre terão seu espaço.

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Alguns exemplos de profissões de baixo movimento: médicos, pilotos de provas, contadores, físicos, astrônomos, engenheiros, mestres enxadristas.
De profissões de elevado movimento: economistas, previsores financeiros e de futebol (como vimos), cientistas políticos, jornalistas, várias áreas da administração.

* A revista exame fez uma reportagem de capa sobre esse assunto, cujo título foi “Para que servem os analistas”. Foi discutido principalmente a recente crise financeira mundial, e o porquê dos “especialistas” não preverem e não dizerem nada, ou seja, eles sabiam tanto quanto nós sobre o que iria acontecer: nada.

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